domingo, 13 de janeiro de 2013

Partindo para longe: afinal, o que buscamos?


“Quando considero (...) o pequeno espaço que ocupo e que vejo tragado pela imensidão infinita de espaços dos quais nada sei e que nada sabem a meu respeito, assusto-me e impressiono-me de me ver aqui e não lá: não existe motivo para que eu esteja aqui e não lá, agora e não então. Quem me pôs aqui?”
Pascal, Pensées, 68


            Chega um momento em que é preciso parar tudo diante da possibilidade de transformar o sonho em acontecimento concreto: finalmente, aquela viagem. A viagem dos sonhos almejada por anos, o intercâmbio, a oportunidade de emprego imperdível fora do país, a mudança de vida para o exterior que sempre fez tanto sentido e que agora é a hora de botar em prática com todos os medos e anseios...  A verdade é que existem poucas coisas na vida que nos “puxem mais pelo estômago” do que uma viagem. O estômago é o órgão que responde aos nossos anseios mais primitivos: aquele que recebe o que vem do mundo e também o que pede pelo que está lá fora quando o que está dentro não mais satisfaz. A fome chega e nos faz desejar o mundo. Mas afinal, que fome é essa? Temos fome de quê?


            Alain de Botton, em sua obra “A arte de viajar”¹, fala sobre o desejo de viajar que chega para nós, na maioria das vezes, junto com um monte de expectativas. Para o autor, poucas atividades revelam tanto a respeito da dinâmica pela busca da felicidade do que o ato de viajar, com toda a sua empolgação e seus paradoxos. É certo que a “fome” de cada um de nós é algo muito particular e com muitas nuances diferentes, sendo quase impossível determinar um único desejo comum a todos. Entretanto, talvez a busca pela autorrealização seja um desejo prevalente na maioria das situações: nós só nos movemos quando o que está aqui não está bom, quando o que existe “cá” não nos satisfaz mais – e então vamos para “lá”.
            Buscamos, assim, algo lá fora que nos realize, que contenha aquilo que atenda aos nossos anseios presentes. E é por meio deste passo que, movidos pela nossa própria falta, abrimos a porta de casa rumo ao novo, ao desconhecido. Porém, este desconhecido é, paradoxalmente, também o conhecido da nossa própria intimidade. Sim, nossas faltas, nossos desejos e tudo aquilo que almejamos falam muito de nós, talvez mais do que quando nos sentimos completos.
O que tem lá fora sempre nos leva a um encontro com nós mesmos. É através do próprio contraste com o diferente que percebemos o nosso contorno, as nossas especificidades. Talvez aquela “fome” seja a fome do nosso próprio íntimo, de fazer contato com o que somos através das nossas aspirações, do nosso caminhar e das nossas mais ousadas realizações. Afinal, também somos a incerteza, o movimento e o que nos “chama” ao encontro. A viagem, eu diria, é a busca por um mergulho na nossa própria existência.


¹BOTTON, Alain de. A arte de viajar. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2012.


Foto: http://www.zenitecerimonial.com.br/conteudo.php?tit=pacotes_de_viagens_cvc&id=28


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